quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

MORAL RELIGIOSA CRIADA ATRAVÉS DO MEDO


“O juízo moral tem em comum com o religioso o crer em realidades que não existem”. Assim Nietzsche desnuda o enquadramento que se pretende dar aos seres humanos no ideal cristão. De acordo com ele o que se “exige do filósofo é que se coloque além do bem e do mal, que ponha sob si a ilusão do juízo moral”. Os homens com a vontade insana de se purificar dos pecados resolveram seguir a moral criada pelos representantes da divindade (sacerdotes, padres, bispos, clérigos, pastores). Criada por tais pessoas, tal moral, diz Nietzsche, é, aparentemente, uma autoridade superior à qual se obedece, não porque ordene o que é melhor, mas simplesmente porque ordena, e não obedecer a tal autoridade torna-se algo imoral.

Assim é criado o medo. Através do medo frente a tal “inteligência superior” que ordena, tem-se que seguir a lei dessa moral. Isso também tem ligação direta com o medo de um poder incompreensível e impreciso de qualquer coisa que ultrapassa o individual humano. Medo repleto de superstição. Sim, porque foi através do temor a um deus, temor esse espalhado pelos sacerdotes, que se tentou melhorar o ser humano com o que denominaram de moral. Mas, camaradas, o que podemos dissertar aqui sobre a moral no âmbito nietzschiano?

Basta que tentemos a simplicidade na leitura em “O Crepúsculo dos Ídolos”. Está lá na página 69: “A domesticação do animal humano e a criação de uma espécie determinada de homens são um melhoramento e essas noções zoológicas as únicas que expressam realidades, porém, realidades que o melhorador típico, o sacerdote, ignora e não deseja saber nada a respeito. Chamar melhoramento à domesticação de um animal soa aos nossos ouvidos quase como uma brincadeira, Contudo, duvido muito que o animal acabou melhorando. É debilitado, é feito menos perigoso; com um sentimento deprimente do medo, com a dor e as feridas faz-se dele um animal enfermo. O mesmo sucede ao homem domesticado, a quem o sacerdote tornou melhor”.

Para o filósofo, a moral cristã é repleta de malefícios. E tais malefícios foram incutidos nos seres humanos. Tal tipo de moral enjaulou o humano e ao domesticá-lo o transformou em algo doente, estabelecendo nele valores niilistas porque uma parte de sua natureza foi negada para ceder espaço e lugar a uma natureza, mutilada, oposta ao racionalismo. Onde, pergunta Nietzsche, se encontra o humano no homem cristão quando nega sua sexualidade, quando nega seu corpo, quando nega seu amor como o encontro com o outro, quando nega sua paixão também no encontro com o outro, que pode ser até mesmo sexual? Simplesmente seria mais fácil dizer que não tem validade alguma ser cristão se para ser isso temos de viver ameaçados com uma punição terrível por nos comportarmos mal na presença de um deus.

Ora, no raciocínio que propõe o filósofo, o erro da moral está em crer que seus princípios são absolutos e ideais. A moral, como instituição, serviu para retirar o homem do estado de natureza, legalizar a vida em sociedade, perpetuar os costumes e dirigir as sociedades pelas gerações como sua cultura, mas cultura falsa porque foi construída por outros homens e jamais por uma divindade. Assim, tal moral “imortalizou a prática religiosa na vida cotidiana, impôs a noção de culpa ao homem que a transgredisse e determinou as relações comerciais e afetivas através dos castigos”(...)

Nietzsche propõe assim a transvaloração dos valores, o que é o mesmo que a abolição da moral cristã, fato determinante para abolir a principal base dessa moral que é a religião que domina o Ocidente há mais de dois mil anos: o cristianismo. Friedrich Nietzsche não pregava uma revolução como Karl Marx. O que podemos perceber e perceberemos na leitura e releitura de seus escritos, é que cada um que o ler se conscientize acerca dos seus argumentos e que perceba que ser cristão é entregar sua vida para uma fantasia ou para a vontade da moral dos padres, bispos, pastores etc.
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Textos consultados:
NIETZSCHE, Friedrich. O Anticristo. São Paulo, Martin Claret, 2000
…................., Crepúsculo dos Ídolos, Ediouro, 1999.
…................., A Genealogia da Moral. In: Os Pensadores. V. XXXII. Ed. São Paulo: Abril Cultural, 1982.

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