segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

SOLIDÃO RECIFENSE


Amigos, eu tinha um poema nos arquivos da memória.
Porém, ele se escondeu lá no bairro de Santo Antônio
Entre os gabaritos dos arranha-céus da Guararapes.
E, como era já tarde, veio-me o sono
E o eco do Capibaribe como se chorasse
Um passado inverno que o verão escondeu.

Atravessei a tarde devagar com meus soluços
E toda a mendicidade me estendia mãos raquíticas.
Eu me sentia muito mais mendigo do que todos.
E via o Recife como um morto.
O amor das suas ruas entranhado no meu amor morto.
A dor que era minha entranhada no Recife morto.

E eu voltava de um dia que nada fora
Senão uma dor e um amor perdido nestas calçadas.
Um amor construído sob o brasão desta cidade.
Sob suas estrelas, suas auroras, suas noites.
E, hoje, adormecendo, já se consumou meu esteio.
Um dia a mais ou outro dia qualquer não fará falta.
A cidade será sempre a mesma.
Cada vez mais acrescentada de dor e ódio
E de um brilho ínfimo das auroras inúteis.


(poema inserido no meu primeiro livro MEIO A MEIO, lançado em 1980)

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